domingo, 14 de junho de 2020

O viés maléfico das redes sociais disfarçado de exercício ao direito à livre manifestação




O INCENTIVO E A PRÁTICA DE ATOS DE INTOLERÂNCIA E DE DISCURSOS DE ÓDIO NAS REDES SOCIAIS:

O crescente uso das redes e das mídias sociais, já estava sendo observado de muito. Com a chegada da pandemia e do isolamento social, ele se ampliou sobremaneira. As pessoas passaram a se utilizar das ferramentas de comunicação, para conversar, para trabalhar, para o lazer, para a religiosidade, para aquisição de bens e serviços, enfim, as tarefas que anteriormente eram executadas presencialmente, passaram a ocorrer dentro do ambiente virtual, revelando os sinais dos tempos modernos e a evolução da tecnologia dentro dos novos caminhos da realidade social.

Benefícios que se incorporaram a rotina das pessoas, ao dia a dia, em tempos que grande parte da população no mundo, ficou impedida de sair as ruas por determinação das autoridades sanitárias, tentando se defender do desconhecido, o Covid-19.

Se antes da chegada do malsinado Corona vírus, poucos eram não os usuários, certamente na atualidade esses números foram mais reduzidos, ocorrendo de certa forma processos de inclusão digital constantes, na prática, com pessoas das mais diferentes idades e gerações. De crianças em face do ensino à distância, aos idosos para uso dos sistemas de vídeo-chamadas, de vídeo conferências, para conversar com os familiares, para participar de reuniões em entidades e associações etc.

As mídias sociais são sem sombra de dúvidas, excelentes espaços para compartilhar conhecimento, suscitar discussões e muito mais. São aspectos muito positivos, que acabam por tornar imprescindível que as pessoas participem, já que além de se atualizarem com temas que movimentam a sociedade como um todos, ainda contribuem para fomentar a cultura, disseminar o conhecimento e ampliar os horizontes de todos os cidadãos, de sorte a permitir a evolução positiva da realidade social. Todavia, ainda que existam pontos de elevada positividade, existem também pontos negativos, prejudiciais e até mesmo maléficos, na medida em que podem adentrar por searas que evidenciem condutas moralmente reprováveis.

Em uma visão simplista, como frequentador das redes sociais há mais de 12 anos, sob o ponto de vista sociológico, porém sem me arvorar na condição de sociólogo, ousaria dizer que de alguns tempos para cá, algumas ferramentas de comunicação, que objetivavam ampliar, dinamizar e fortalecer os relacionamentos entre as pessoas nas mais diversas e até mesmo distantes localidades, passaram a descortinar o “lado maléfico” das pessoas, aflorando-os com maior intensidade. Noto que as redes sociais, espelham a conduta das pessoas exteriorizadas no mundo real, porém tais pessoas se tornam mais rudes, mais grotescas, talvez porque imaginem que o mundo virtual, lhes assegure condições de se ocultarem ou eventualmente de se eximirem de futuras punições.

Não são poucas as pessoas que passam a desferir ofensas e agressões das mais variadas, preconceituosos, odiosas, disseminando, incitando a prática de atos contrários a lei, a moral e aos bons costumes, como se estivessem valendo-se destas ferramentas de comunicação, como “palanques de suas posturas intolerantes”, partindo da errônea premissa de que a Internet fosse considerada uma verdadeira “terra sem lei”, que os manterá protegidos sob o manto da impunidade.

Este viés maléfico da Internet e das redes sociais, revelado através da prática de condutas lesivas a bem jurídicos amplamente tutelados e protegidos, acabam por alcançar na essência a “dignidade humana” e como tal, passam a violar direitos humanos, revelando-se assim, verdadeiros excessos à liberdade de expressão, direito adotado para tentar justificar as ações maléficas cometidas.

Na minha modesta opinião, são quatro as premissas que fomentam, que incentivam que as pessoas mal intencionadas adotem essas posturas por meio da Internet e das redes sociais: a) o anonimato, b) a comunicação informal; c) a rápida difusão e propagação do conteúdo e d) a liberdade.

Pois bem, com lastro em tais premissas, as ações criminosas são cometidas no ambiente virtual, alcançando na essência como acima mencionado, o Princípio da Dignidade Humana, violando os direitos humanos e fomentando a discórdia, o discurso de ódio e a intolerância.

Posturas de intolerância, de racismo, de discriminação em relação ao gênero, a raça, a cor, as ideologias religiosas, políticas e a propagação de discursos de ódio, se tornam por demais preocupantes, na medida em que, são veiculadas com uma rapidez assustadora, com grupos que se organizam velozmente e acabam, sob os auspícios do que seria, um suposto exercício ao direito à livre manifestação, ao direito à liberdade de expressão, adentrando para a seara da prática de atos moralmente reprováveis e contrários à Lei e ao Direito.

Todos nós estamos acompanhando os efeitos e as consequências do triste episódio que ocasionou a morte de um segurança negro, sufocado por um policial branco nos EUA, que mostrou absoluto despreparo para estar investido em autoridade. Um homem que matou outro homem e transformou o mundo em campo de batalha.

As manifestações legitimas sob o ponto de vista da liberdade de expressão, do direito de o povo reivindicar respeito à igualdade, à liberdade, e o fim de posturas eivadas de preconceito, de uso da força ao invés da lei, acabaram descambando para caminhos tortuosos. De forma radical, vieram ações e movimentos que geram levaram a destruição de patrimônio público, de patrimônio privado e até mesmo de registros históricos representados por estatuas e monumentos, o que se ampliou pelo mundo, alcançando inclusive o Brasil. Isto não é bom! A criação de divisões de grupos sociais, pode levar ao descontrole e até a ações de confrontos totalmente descabidas.

E as redes sociais por seu turno, tornaram-se o grande instrumento para fomentar essas discussões, não de forma cientifica, sociológica e histórica, e sim, de forma a propagar o enfurecimento, a malevolência, a cólera de diferentes grupos, ampliando a discórdia entre os homens e uma tentativa de se atingira a ruptura, de forma a punir no presente, as ações humanas praticadas no passado, evidenciando a hipótese de prática de “exercício arbitrário das próprias razões” ou eventualmente, a sanha, o desejo de vingança de “fazer Justiça com as próprias mãos”!

Penso que o passado, por mais errado que tenha se mostrado, é a referência no presente, para que os equívocos não se repitam no futuro. Da mesma forma que caberia o entendimento no sentido de que a destruição do patrimônio público, notadamente estátuas, monumentos, prédios ou qualquer manifestação que tenha sido soerguida, edificada em determinado momento, e, que faça alusão a épocas passadas, a fatos, a circunstâncias, a pessoas, não deveriam ser objeto de mutilação, destruição, depredação ou demolição, como uma forma de reparar eventuais danos sofridos por parte da humanidade no passado.

Por trás de cada obra, cada escultura, cada edificação, existe a arte, o patrimônio cultural imaterial que se firmou graças a criação e o intelecto de um ser humano, de um artista, de alguém que despendeu tempo para executar aquele trabalho que deveria permanecer para todo o sempre.

Os contextos históricos, das condutas, dos atos praticados, dos malefícios, eram próprios de suas épocas, afetos as suas realidades, aos seus costumes, as suas formas de agir, as suas leis, as suas regras de convivência, daí porque, a sociedade evolui e a realidade social vai se modificando de forma tal, a alterar inclusive as leis que regem as Nações, que disciplinam os Estados  e as regras de condutas dos cidadãos.

E nesse esteio, causa-nos muita tristeza ver o crescente uso das redes e mídias sociais, para a propagação desses discursos carregados de cólera, repletos de colocações depreciativas, que estão incitar o ódio, a destruição de patrimônios culturais imateriais pelo mundo, sem respeito às obras, aos artistas e o que elas representam em cada local que se encontram, como se a sociedade atual, tivesse o dever de arcar com os ônus do que ocorreu no passado, e, sob os auspícios da livre manifestação, ações extremistas, sem respeitar o império da legalidade, tentando “fazer Justiça com as próprias mãos”!

Que bom seria, se através do diálogo, do entendimento, da correta interpretação dos contextos históricos, as pessoas entendessem e se utilizassem das redes sociais, para difundir e discutir os fatos históricos, educando as novas gerações para, sob o respeito do Princípio da Igualdade, pudéssemos construir uma sociedade mais justa, fraterna e igualitária!

GILBERTO MARQUES BRUNO - Advogado é sócio fundador de MARQUES BRUNO Advogados Associados em São Paulo – É Tributarista e especialista em Direito Empresarial, Direito Público e Direito Eletrônico – É Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito das Faculdades Metropolitanas Unidas – FMU (Turma de 1988) - É pós-graduado em Direito Empresarial (lato senso) e Direito Tributário (estrito senso) pelo Centro de Estudos e Extensão Universitária das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) 1.ª Turma (1992) - É conselheiro da Associação Comercial de São Paulo - ACSP (2019/2021) – É conselheiro da Associação dos Advogados Trabalhistas de São Paulo – AATSP