sexta-feira, 17 de julho de 2020

Será que estamos prestes a conviver com uma nova CPMF no sistema tributário nacional?

O ITD - IMPOSTO SOBRE TRANSAÇÕES DIGITAIS UMA REALIDADE MUNDIAL DIANTE DA GLOBALIZAÇÃO DA ECONOMIA COM O ADVENTO DA INTERNET

Salvo maior engano, por volta do ano de 2002, tive oportunidade de discorrer a respeito do promissor mercado de arrecadação tributária que se avizinhava com o crescente uso da internet no mundo e na sociedade brasileira.

Na medida em que os anos foram transcorrendo, modalidades de tributação no ambiente virtual também surgiram, e, evidentemente, diante do crescimento das transações digitais durante esse período de pandemia, cujos números realmente surpreendem, voltam à baila discussões sobre a criação de uma nova modalidade tributária, que nasceria com o escopo de tributar as operações digitais.
Essa realidade não é uma figura especial, ou uma criação tributária decorrente de ideias perversas do governo federal, com o intuito de ampliar os níveis de arrecadação tributária, objetivando saciar a voracidade do fisco.

Esse tema já vem sendo objeto de discussão, inclusive no âmbito da Europa e dos Estados Unidos, tanto é fato, que a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (uma organização econômica intergovernamental com 38 países membros), fundada em 1961 para estimular o progresso econômico e o comércio mundial, situada na França, antes mesmo da chegada da pandemia, já estava elaborando um plano para taxar a economia digital e salvar centenas de bilhões de dólares de impostos que poderiam ser recolhidos aos cofres públicos das diferentes nações. Esse projeto já contava com o apoio de 137 países, antes mesmo da chegada da pandemia.
Apresentado para consultas em outubro do ano passado, o plano ainda depende de amplo acordo internacional. Em janeiro deste ano, mais um passo para o entendimento fora anunciado pelo ministro de Finanças da França, Bruno le Maire, onde os governos francês e americano concordaram em negociar as bases de um imposto digital global, porém com o advento da Pandemia do Corona vírus, esse assunto acabou sendo sobrestado.

Enquanto as atividades digitais prosperam e se espalham por todo o mundo, os países perdem receita de impostos. A tributação ainda é geralmente baseada na presença física das empresas ou de suas filiais ou subsidiárias. Mas um volume crescente de negócios é hoje realizado sem essa presença. Além disso, empresas podem alojar-se, para fins tributários, em paraísos fiscais, como Bermudas, Ilhas Cayman, Bahamas ou Jersey.

Essa é uma visão mundial, destinada a normatizar tais operações e com isto das nações ampliarem os espectros de arrecadação tributária.

Voltando a nossa realidade, muitos estão a dizer que se trata de permitir o renascimento da malsinada Contribuição Provisória sobre a Movimentação ou Transmissão de Valores e de Créditos e Direitos de Natureza Financeira, identificada sob a sigla CPMF que teve aplicabilidade e vigência no período compreendido entre 1997 a 2007, ou seja, que tributou durante uma década as operações e transações financeiras no Brasil.

Em meio a crise que o mundo e o Brasil estão atravessando em decorrência da pandemia, notadamente no âmbito da economia, renascem os indícios de que o governo deverá propor a criação de um tributo destinado a incidir sobre transações financeiras realizadas no ambiente digital, esse será de forma genérica o fato gerador da nova hipótese de exação.

Em uma primeira imagem, a eventual modalidade tributária, cuja denominação não é definitiva, deverá funcionar de forma semelhante à antiga CPMF, que mesmo sendo instituída com finalidade específica e em caráter provisório, tributou a sociedade brasileira por cerca de uma década.

De acordo com o ministro da economia, o novo tributo teria por premissa maior o escopo de compensar e eventualmente permitir a desoneração de outras contribuições no atual momento, sendo que, algumas que inclusive deveriam ou devem ser extintas em um projeto de eventual reforma tributária.

Segundo o governo, os níveis de arrecadação tributária precisam ser majorados e diante do crescimento das operações realizadas no âmbito do comércio eletrônico, que segundo dados do próprio ministério da economia, tiveram um crescimento de 70% (setenta por cento) em junho de 2020, se comparadas com o mesmo período em 2019.

Evidentemente as operações de e-commerce, como já disse em situações pretéritas, revelam-se promissoras no âmbito mundial e, notadamente no Brasil. Este período de pandemia revelou essa realidade.

O isolamento social, fez com que grande parte da população brasileira intensificasse o uso de operações de comercio eletrônico, compras de suprimentos, medicamentos, alimentos e diferentes bens de consumo. Grandes redes, abriram suas plataformas com o escopo de auxiliar pequenos empreendedores a comercializar seus produtos sem qualquer sorte de ônus. Um auxílio virtual, que certamente permitiu que muitos que mantinham seus estabelecimentos físicos de portas cerradas, tivessem condições de conseguir um faturamento ainda que pequeno, mas que permitisse quitar obrigações rotineiras.

Se de um lado o comércio viveu momentos positivos em meio a crise da pandemia, com a realizações de transações digitais, de outro, a população passou a se adaptar a essa realidade e, certamente muitos continuarão mesmo após a crise de saúde pública, valendo-se das operações de comercio eletrônico para aquisição de bens e serviços das mais diferentes naturezas.

Obviamente um segmento de atividade em crescimento, promissor e que demonstrou essa realidade e que muito mais terá a evoluir, pois passou, certamente por esse “grande teste” com a crise de saúde pública que assolou e assola o mundo e o país.

Diante desse fato, o governo certamente, mesmo em função dos problemas econômicos que vamos enfrentar quando tudo isso passar, pois uma crise na economia é inevitável, identificou uma possibilidade de ampliar os níveis de arrecadação, tributando assim, as operações realizadas no âmbito do universo virtual.

Dentro do projeto do governo, o novo tributo não alcançará aqueles que recebem remuneração de até 2,5 salários-mínimos por mês.

Em termos de alíquotas, a pretensão do governo com a eventual instituição da nova exação, deverão ser estabelecidas entre 0,2 a 0,4%, dependendo da redução de outras modalidades tributárias, visto que a mesma, estaria integrando a proposta de reforma tributária que deverá ser em breve encaminhada ao Legislativo. Existem outras alterações em outros tributos, que poderão elevar a carga tributária, mas não cabem no presente momento ser discutidas.

O governo justifica que a instituição desse novo tributo que está por vir, é “feio, mas não é tão cruel” quanto os outros, e, “se todo mundo pagar um pouquinho, não precisa pagar muito”. 

E, segundo o minsitro Paulo Guedes, essa base de arrecadação, não implicaria em majorar a carga tributária e sim compensar a redução de outros impostos, como encargos trabalhistas que incidem sobre a folha de pagamentos, caso em que seria possível estimular a geração de empregos formais no período pós-pandemia.
No que concerne ao fato gerador desse novo tributo, ainda não se tem a sua amplitude, a sua capilaridade, o espectro da incidência e em que hipóteses e de que forma ocorrerão. 

Atualmente são realizadas diferentes operações no âmbito da Internet, no comercio eletrônico, por exemplo, temos: B2C (Business to Consumer); B2B (Business to Business) e C2C (Consumer to Consumer), dentre outras, que evidentemente movimentam bilhões de reais aqui no Brasil. 

Outros tipos de transações e operações crescem, na mesma proporção que a quantidade de usuários se utilizam da internet e das ferramentas de comunicação, logo, não poderia ser diferente, que o governo visualizasse a existência deste promissor mercado de arrecadação tributária, mesmo porque essa é uma tendência mundial.

Enfim, na medida em que os números de transações no ambiente virtual, estão crescendo e tendem a crescer muito mais, na mesma proporção que a população vai se ambientando com as benesses que a tecnologia permite no dia a dia de todos, a instituição do imposto sobre transações digitais (ou qualquer outra denominação que possa ter), é uma realidade que não deverá ser afastada, na minha modesta opinião, será uma questão de tempo.

O que evidentemente espero, é que realmente os princípios da sua instituição, sejam legítimos, que possa nascer uma nova modalidade tributária em substituição de outras de exações, que oneram por demais o dia a dia das atividades empresariais em nosso país, notadamente os micro, pequenos e médios empresários, que a bem da verdade, são aqueles que fazem a economia se movimentar e que geram empregos para a subsistência da grande maioria da população brasileira que ainda possui o vínculo formal.

Que dentro do Poder de Tributar previsto Constitucionalmente, o Estado brasileiro, não venha a estabelecer uma nova modalidade de tributação que apenas majore os parâmetros de arrecadação tributária, e, que esse ônus, se instituído, seja objeto de substituição

Gilberto Marques Bruno

Advogado é sócio fundador de MARQUES BRUNO Advogados Associados em São Paulo – Tributarista e especialista em Direito Empresarial, Direito Público e Direito Eletrônico – Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito das Faculdades Metropolitanas Unidas – FMU (Turma de 1988) - Pós-graduado em Direito Empresarial (lato senso) e Direito Tributário (estrito senso) pelo Centro de Estudos e Extensão Universitária das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) 1.ª Turma (1992) - Conselheiro da Associação Comercial de São Paulo - ACSP (2019/2021) –  Conselheiro da Associação dos Advogados Trabalhistas de São Paulo – AATSP. (gmbruno@aasp.org.br)