quarta-feira, 23 de setembro de 2020

Aprovada resolução que cria Plataforma Digital do Poder Judiciário Brasileiro

UM CAMINHO PARA UNIFORMIZAÇÃO DO PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO (PJE):

A PLATAFORMA DIGITAL DO PODER JUDICIÁRIO BRASILEIRO (PDPJ-Br) 

 

(a)        A implantação do processo judicial eletrônico e a utilização da tecnologia – a mudança de uma cultura que acompanhou várias gerações:

Quando escrevi pela primeira vez sobre a virtualização do Processo Judicial, defendendo a adoção dessa ferramenta tecnológica como instrumento que poderia racionalizar sobremaneira o funcionamento do Poder Judiciário, confesso que não poderia imaginar que quase duas décadas depois, da data em que meu primeiro artigo a respeito do tema, foi publicado no site Consultor Jurídico, denominado “Justiça opera com ferramentas do mundo virtual” (https://www.conjur.com.br/2001-mar-14/justica_adere_informatizacao_agilizar_processos), a comunidade jurídica, tivesse tão familiarizada com o uso das ferramentas tecnológicos e com o próprio processo tramitando pelo meio eletrônico.

Embora a Lei Federal n.: 11.419, de 11 de dezembro de 2006, que entrou em vigor 90 (noventa) dias após a sua publicação, ao implantar o sistema do Processo Judicial Eletrônico (PJE), tenha causado uma série de inquietudes entre todos os operadores do Direito, notadamente os profissionais do Direito de idade mais avançada, o fluir dos anos permitiu que entre erros e acertos, ajustes e muitas dificuldades técnicas, passássemos a conviver e aprender a extrair o máximo de benefícios da nova tecnologia.

As legislações foram se adaptando, o novel Código de Processo Civil, trouxe regras expressas para tratar de uma série de atos processuais pelo meio eletrônico, os sistemas foram se aprimorando, evoluindo de acordo com a necessidade e, nesses tempos de pandemia, pudemos observar que mesmo com algumas resistências, algumas mudanças nos foram impostas por necessidade e com elas, vieram vídeo audiências, agendamentos eletrônicos para retirada de autos físicos, possibilidade de conversão de autos físicos em eletrônicos para racionalizar a tramitação e tantas outras possibilidades, que mesmo remotamente, permitiram que a prestação jurisdicional continuasse a ocorrer.

Quem poderia um dia imaginar que realizaria uma sustentação oral virtualmente?  Creio que muitos não.

Particularmente imaginava que isto um dia aconteceria, porém que não seria tão rápida a sua implantação como o foi com o advento da crise de saúde pública.

A minha primeira sustentação oral, sob a forma de vídeo conferência, trouxe a mesma expectativa da primeira realizada perante a tribuna do Tribunal e aconteceu, da mesma forma as vídeo audiências, que hoje como costumo dizer, fazem parte do “novo que já não é tão normal”.

Enfim a tecnologia veio como aliada do Poder Judiciário, do Ministério Público, da Advocacia e de todos os operadores do Direito, em um caminha sem volta.

Um caminho que vem sendo trilhado nestas quase duas décadas, evoluindo dia a dia, nos compelindo a ficarmos atentos com sistemas, programas, ferramentas e aplicativos das mais diversas modalidades, como é o caso por exemplo da Inteligência Artificial (IA) que já está sendo objeto de implantação nos Tribunais Superiores, como é o caso do Projeto Sócrates do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Projeto Victor do Supremo Tribunal Federal (STF).

Uma conexão estável e um tablet, um smartphone ou computador pessoal, nos permite trabalhar de qualquer canto do planeta, ou seja, o futuro é agora.

(b)        A Plataforma Digital do Poder Judiciário Brasileiro (PDPJ-Br):

E nesse esteio, ontem (22.09), foi aprovada em sessão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a criação de uma plataforma digital destinada a congregar todos os mecanismos e sistemas de tramitação do Processo Judicial Eletrônico (PJe).

Tanto no programa desenvolvido inicialmente e funciona no âmbito da Justiça Federal Comum e na Justiça Federal do Trabalho, quanto nos outros que foram criados por outros Tribunais ou pela iniciativa privada que permitiram que o processo deixasse de tramitar fisicamente e ingressasse no mundo virtual.

Durante a tricentésima décima oitava sessão ordinária do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), foi aprovado o Processo nº 0007555-97.2020.2.00.0000 que institui a Plataforma Digital do Poder Judiciário Brasileiro (PDPJ-Br). Trata-se de um sistema multisserviço, destinado a unificar o trâmite processual no Brasil.

O ato normativo aprovado à unanimidade, em última análise, institui a política pública para a governança e gestão de processo judicial eletrônico; integra os Tribunais do país com a criação da Plataforma Digital do Poder Judiciário Brasileiro – PDPJ-Br; mantém o sistema PJe como sistema de Processo Eletrônico prioritário do Conselho Nacional de Justiça – CNJ.

O ato de cinco capítulos e vinte e seis artigos, está estruturado da seguinte forma: Capítulo I - Plataforma Digital do Judiciário Brasileiro; Capítulo II - Política de Governança e Gestão da PDPJ-Br; Capítulo III - Gestão da PDPJ-Br; Capítulo IV - Sistemas Atuais e Capítulo V - Disposições Finais e Transitórias.

Nele serão fixadas as regras que deverão ser adotadas por todos os Tribunais do país, salvo maior engano, para que seus sistemas acabem se ajustando as regras do sistema do Processo Judicial Eletrônico (PJe).

(c)        Dos objetivos da Plataforma Digital do Judiciário Brasileiro (PDPJ-Br):

A Plataforma Digital do Judiciário Brasileiro, tem por objetivo: a - integrar e consolidar todos os sistemas eletrônicos do Judiciário Brasileiro num ambiente unificado; b - implantar o conceito de desenvolvimento comunitário, no qual todos os tribunais contribuem com as melhores soluções tecnológicas para aproveitamento comum; c - estabelecer padrões de desenvolvimento, arquitetura, experiência do usuário (User Experience - UX) e operação de software, obedecendo as melhores práticas de mercado e disciplinado em Portaria da Presidência do CNJ; d -  instituir uma plataforma única para publicação e disponibilização de aplicações, microsserviços e modelos de inteligência artificial (I.A.), por meio de computação em nuvem.

Uma forma de buscar a uniformização, o que aparentemente revela um ponto positivo, visto que existentes diferentes sistemas com regras diferentes e que acabam de certa forma, dificultando o trabalho de alguns atores do processo, como é o caso da Advocacia.

Basta que se tome por exemplo o sistema PJe nas Justiças Federais Comum e do Trabalho e o E-Saj no âmbito do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, os Advogados e Advogadas são compelidos a ter conhecimentos específicos em cada um dos programas para poder operar, e, em algumas situações precisam ter 02 (dois) equipamentos para poder desenvolver suas atividades profissionais.

(d)        Da preservação do Processo Judicial Eletrônico (PJe):

Através desta nova plataforma digital, será preservado o Processo Judicial Eletrônico (PJe) como a principal ferramenta tecnológica para tramitação processual na justiça brasileira e por ela, deverá o CNJ, promover a adequação das atividades do Poder Judiciário à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD – Lei Federal n.: 13.709/2018).

De acordo com o novo presidente do CNJ, ministro Luiz Fux, que foi o relator da proposta, ficou claro que a plataforma deverá modernizar o PJe no Brasil, e, permitir a sua expansão, criando um ambiente colaborativo para que possam ser desenvolvidas novas funcionalidades que atendam a todos os tribunais do país. Enfatizou o presidente do CNJ, que:

...“O principal objetivo é modernizar a plataforma do PJe e transformá-la em um sistema multisserviço que permita aos tribunais fazer adequações conforme suas necessidades e que garanta, ao mesmo tempo, a unificação do trâmite processual no país.”...

A resolução está formalizando uma alteração conceitual do PJe e está a estimular que os sistemas públicos, venham a convergir naturalmente para a arquitetura do sistema do Processo Judicial Eletrônico, embora a nova norma reconheça que existam outros sistemas públicos gratuitos em produção em vários tribunais, e que os custos de migração das bases da dados para uma plataforma única, não seriam compensatórios.

Seguindo esse raciocínio, complementa o presidente do Conselho Nacional de Justiça, ministro Luiz Fux que: ...“Opta-se, portanto, por autorizar sua disponibilização na PDPJ, com o aval do CNJ, mas com o condicionante de que os futuros desenvolvimentos sejam realizados de forma colaborativa, impedindo a duplicação de iniciativas para atender às mesmas demandas, mediante tecnologia e metodologia fixadas pelo CNJ.”...

Ao mesmo tempo, restará vedada a contratação de qualquer novo sistema, módulo ou funcionalidade privados, mesmo sem custos ou que cause dependência tecnológica ao respectivo fornecedor e impeça o compartilhamento da solução na PDPJ-Br.

O presidente do CNJ enfatizou que o funcionamento do modelo depende da agregação dos tribunais e de governança. E asseverou que: ...“O objetivo é consolidar a política para a gestão de processo judicial eletrônico, integrar todos os tribunais e eliminar os conflitos entre qual é o melhor sistema. O PJe permanece como sistema patrocinado pelo CNJ e principal motor da nova política.”...

Na essência, a plataforma tem como premissa maior, fomentar o desenvolvimento colaborativo entre os tribunais, de sorte a unir todo o sistema de justiça em um conceito de trabalho comunitário, no qual, todas as cortes possam contribuir com as melhores soluções tecnológicas para aproveitamento comum.

O que vale dizer, o principal objetivo, seria a criação de uma ferramenta destinada a agregar todas as plataformas que seriam facilmente encontradas e oferecidas aos seus usuários, o que poderia reduzir expressivamente os custos e elevar sobremaneira os fornecimentos, entregas e serviços de informática de todos os tribunais.

Aprovada á unanimidade, a resolução, “veda  a contratação de qualquer novo sistema, módulo ou funcionalidade privados, mesmo de forma não onerosa, que cause dependência tecnológica do respectivo fornecedor e que não permita o compartilhamento não oneroso da solução na PDPJ-Br.”

Estabelecendo critérios para modificação de contratos que porventura os Tribunais possuam, que não lhes assegure o direito à propriedade das funcionalidades desenvolvidas no sistema, e que também não tenha direito aos códigos fonte, documentação e quaisquer outros artefatos que venham a ser produzidos, sendo-lhe assegurado prazo para adequação.

Se eventualmente os Tribunais não atenderem a tais aspectos, poderá ensejar: a) a responsabilização do ordenador de despesas por improbidade administrativa, sem prejuízo da comunicação ao Tribunal de Contas respectivo; b) apuração de possível responsabilidade disciplinar dos gestores de TIC e da administração do respectivo Tribunal.

(e)        Das conclusões:

Da leitura ainda que superficial da resolução aprovada, cuja publicação deverá ocorrer brevemente, quer me parecer que, a Política de Governança e Gestão da Plataforma Digital do Poder Judiciário Brasileiro (PDPJ-Br), está voltada de um lado, a fomentar, a incentivar o desenvolvimento colaborativo, comunitário, para que se possa em médio prazo levar a uma uniformização dos sistemas, onde cada uma das peculiaridades de cada um dos Tribunais, possam ser absorvidas pelo sistema do Processo Judicial Eletrônico (PJe), que poderá assim operar dentro da plataforma denominada PDPJ-Br, sob o controle absoluto do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que passará assim a exercer o total gerenciamento, controle e administração do sistema em todos os Tribunais brasileiros, permitindo um padrão único de operação em todo território nacional.

Igualmente, a Plataforma Digital do Poder Judiciário Brasileiro (PDPJ-Br), deverá possibilitar também a viabilização de meios na implantação da inteligência artificial, de novas tecnologias e de sistemas de automação, destinados a agilizar a tramitação dos processos e elevando os níveis de qualidade e de satisfação na prestação dos serviços públicos em favor da sociedade.

Na teoria o texto aprovado, revela-se ousado e nos remete a presunção, ainda que relativa, de que, na medida em que a plataforma entrar em funcionamento, interligando todos os tribunais de maneira comunitária e colaborativa, o controle de todos os aspectos destinados a atualizar as ferramentas tecnológicas decorrentes dos desdobramentos evolutivos do Processo Judicial Eletrônico (PJe) e da própria Plataforma Digital do Poder Judiciário Brasileiro (PDPJ-Br), ficará concentrada nas mãos do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que passará a ter o controle total e absoluto do Poder Judiciário em todo o Brasil, de sorte que todos os órgãos jurisdicionais do país, a ele se subordinem totalmente no tocante as questões tecnológicas.

O que vale dizer, a política de governança e gestão será executada pelo próprio Conselho Nacional de Justiça (CNJ), já que o ato normativo lhe confere a coordenação, contando sempre que possível com a participação de representantes do Poder Judiciário e do Sistema de Justiça, cuja coordenação será regulamentada posteriormente, em ato da Presidência do CNJ.

Enfim, se bem adotados os dispositivos da resolução aprovada, e, que ainda entrará em vigor, me parece que a tendência será a médio prazo uniformizar o sistema de veiculação do Processo Judicial Eletrônico (PJe), de sorte que possa ser padronizada sua veiculação e tramitação junto a Plataforma Digital do Poder Judiciário Brasileiro (PDPJ-Br), cuja governança será de responsabilidade do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

GILBERTO MARQUES BRUNO

Advogado é sócio fundador de MARQUES BRUNO Advogados Associados em São Paulo – É Tributarista e especialista em Direito Empresarial, Direito Público e Direito Eletrônico – É Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito das Faculdades Metropolitanas Unidas – FMU (Turma de 1988) - É pós-graduado em Direito Empresarial (lato senso) e Direito Tributário (estrito senso) pelo Centro de Estudos e Extensão Universitária das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) 1.ª Turma (1992) - É conselheiro da Associação Comercial de São Paulo - ACSP (2019/2021) – É conselheiro da Associação dos Advogados Trabalhistas de São Paulo – AATSP