domingo, 3 de março de 2013

O PROCESSO ELETRÔNICO NA JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO - REVESTE-SE EM UM PROBLEMA PARA A ADVOCACIA


A  IMPLANTAÇÃO DO PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO NO ÂMBITO DO PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DE SÃO PAULO

De muito sou defensor da virtualização do processo judicial e da prática de atos processuais pelo meio eletrônico. O processo eletrônico que sempre imaginei, como instrumento de racionalização da Justiça e destinado a contribuir para que se opere a efetividade da prestação jurisdicional, está muito distante de se assemelhar com o que venho acompanhando nos últimos tempos, após a implantação desse mecanismo no âmbito da Justiça Paulista, especialmente nas Varas Cíveis do Fórum João Mendes e nas comarcas do interior.

Em que pese a iniciativa do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, a forma pela qual vem se dando a implantação, ao invés de se transformar em um benefício para que se opere a celeridade na tramitação dos feitos, está se transformando em um sério e grave problema, causando um sem número de transtornos, tanto para os serventuários da Justiça, quanto para a advocacia e fundamentalmente aos jurisdicionados.

É certo que a implantação já se mostrava mais que necessária, todavia, seria de fundamental importância que fossem estabelecidos mecanismos, para que se desse de forma paulatina e progressiva, para que todos os operadores do Direito pudessem e tivessem condições de se familiarizar com esse novo ambiente, destinado a substituição do meio papel para o meio eletrônico.

No meu sentir faltou sensibilidade da presidência do Tribunal de Justiça Bandeirante, pois, no âmbito do estado de São Paulo, são mais de trezentos mil advogados inscritos na nossa Seccional, número esse, que jamais poderia ser ignorado pelas autoridades do Judiciário Paulista.

A Seccional Paulista da Ordem dos Advogados do Brasil, na pessoa do seu presidente Dr. Marcos da Costa, profundo conhecedor do tema e também de muito defensor da virtualização do processo judicial, sensível a magnitude do problema, em conjunto com as entidades da advocacia do nosso estado (Instituto dos Advogados de São Paulo e Associação dos Advogados do São Paulo), conseguiu no ano passado suspender a implantação do processo eletrônico, de sorte que o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo transferisse a obrigatoriedade de distribuição dos feitos e o peticionamento pelo meio virtual, para o início do mês de fevereiro deste ano.

Em janeiro do corrente, estabeleceu dez diretrizes a serem desempenhadas sob a forma de força tarefa, para que os mais de trezentos mil advogados do nosso estado, pudessem se adaptar a essa nova realidade. Tais premissas vão desde a redução no custo para a aquisição da certificação digital até a realização de palestras, cursos, seminários e congressos em todas as subseções da capital e do interior, para ensinar o passo a passo do processo eletrônico, de sorte que todos os advogados e advogadas do estado de São Paulo possam se capacitar, aprendendo, tirando dúvidas, trocando experiências e constatando possíveis dificuldades que serão levadas ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, para correção das distorções, que, diga-se de passagem, não são poucas.

Particularmente, já participei de alguns desses encontros em dezembro de 2012 e nos meses de janeiro e março desse ano, ministrados pelo conselheiro estadual e presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia da OAB-SP, Dr. Vitor Hugo de Freitas, e pelo também conselheiro estadual e presidente da Comissão de Direito Eletrônico e Crimes de Alta Tecnologia da OAB-SP, Dr. Coriolano A. Almeida Camargo. Em todas as ocasiões os auditórios se apresentaram com sua capacidade de lotação esgotada, sendo certo que entre os participantes, identifiquei as mais diversas faixas etárias, mas também, uma predominância de advogados e advogadas de idade mais avançada, muitos com mais de setenta anos, aqueles que no passado se utilizavam de máquinas de escrever, e, que no meu sentir, são os que mais estão preocupados com os impactos dessa inovação, visto que, essa transição, em termos práticos, já está acontecendo com várias dificuldades não só no estado de São Paulo, mas em todo o Brasil.

O que mais chama a atenção é o fato de que não são poucas as dúvidas apresentadas neste momento de transição. Mas existem também, situações que reputo mais complexas e que podem trazer uma série de problemas para a advocacia e para os jurisdicionados.

Tanto é fato que no ultimo dia 28 de fevereiro, reuniram-se na sede do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, os presidentes das Comissões de Tecnologia da Informação de todas as Seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), oportunidade em que debateram e apontaram os cinco principais problemas detectados pela advocacia brasileira na utilização do Processo Judicial Eletrônico (PJe).
Com sustentáculo nas experiências relatadas, foram indicados os cinco maiores entraves para a implantação do processo eletrônico, quais sejam: (a) a infraestrutura deficiente de Internet; (b) dificuldades de acessibilidade; (c) problemas nos sistemas de processo eletrônico; (d) necessidade de melhorias na utilização do sistema; e (e) a falta de unificação dos sistemas de processo eletrônico.
O lamentável diagnóstico identificado nessa reunião será remetido para o Pleno da OAB, que debaterá o tema e encaminhará as reivindicações da advocacia ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Ministério da Justiça e ao Tribunal Superior do Trabalho. O escopo do envio das reivindicações reside na necessidade de alertar e pugnar pela suspensão das novas implantações até que possam ser definitivamente sanados os problemas de ordem estrutural, de sorte a garantir que os advogados e advogadas do nosso país, possam utilizar-se concomitantemente dos dois sistemas, ou seja, o peticionamento “on line” e o peticionamento físico, evitando-se assim prejuízos que acabariam por atingir não só a advocacia, mas fundamentalmente o jurisdicionado e a sociedade.
O principal problema apontado, pasmem, encontra sustentáculo na deficiente infraestrutura de Internet, especialmente em relação às dificuldades de conexão e quedas no fornecimento dos serviços de energia elétrica.
Vou mais além, pois existem localidades que se quer possuem sinais para conexão de telefone e/ou Internet, outras com sistema de Internet discada e/ou rádio, o que por obvio impede que os advogados e advogadas possam se utilizar com tranquilidade do sistema do processo eletrônico, quer seja para distribuição de novos feitos, quer seja para o peticionamento eletrônico. Isto é muito grave!
Os problemas ligados à acessibilidade, também não poucos, tanto que dentre as reinvindicações, reside a necessidade de fixação de um período de transição para a migração total do meio físico para o meio eletrônico, e, que os tribunais, em respeito a Lei do Processo Eletrônico, disponham de estrutura para a “digitalização” dos processos. Da mesma forma que foram detectadas urgentes necessidades de correção das instabilidades do sistema, ampliação na limitação do tamanho para o envio de arquivos, dentre outros.
Mas o que me parece mais grave em tudo isto, e, de muito já havia me manifestado a respeito, é, a ausência de unificação nos sistemas de processo eletrônico. De forma absolutamente incoerente, no meu sentir, cada tribunal, excetuada a Justiça do Trabalho, viu por bem, desenvolver os sistemas atinentes ao processo eletrônico, estabelecendo inclusive, regramentos próprios, o que se mostra no mínimo absurdo!
Preteritamente, já tive oportunidade de discorrer sobre o tema, manifestando-me sobre o quanto seria importante a padronização e/ou unificação dos sistemas pelos quais os feitos caminhariam eletronicamente.
A grande referência em minha opinião, era a possibilidade de utilização do sistema criado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), pioneiro na “virtualização do processo judicial”, desenvolveu um software específico e se dispôs a fornecer gratuitamente para todos os Tribunais do Brasil, franqueando-lhes inclusive, a instalação, o treinamento aos servidores e o suporte necessário para que todos pudessem operacionalizar o sistema. Todavia, não logrou êxito na iniciativa, e, cada Corte de Justiça, seguindo as suas próprias convicções, foi criando os sistemas de acordo com as suas conveniências.
É lamentável, pois, muito mais simples seria, valer-se de um sistema referência como o que foi criado pelo Superior Tribunal de Justiça (e utilizado inclusive por órgãos do judiciário de outros países), modificando-se apenas naqueles pontos que demandassem as peculiaridades de cada órgão da Justiça.
Enfim, quer me parecer que “cada um resolveu correr com as suas próprias pernas”, imprimindo velocidades das mais diferentes, e, muitas delas, s.m.j, no afogadilho, como se decorrentes de interesses políticos e midiáticos, sem se preocupar com os reflexos que seriam causados não só para a advocacia, mas fundamentalmente para a sociedade brasileira.
Sinceramente, espero que essas distorções sejam urgentemente solucionadas, pois essa não é a forma de processo judicial eletrônico, que sonhei quando comecei a discorrer sobre o tema, lá pelos idos da segunda metade da década de noventa!

Gilberto Marques Bruno