A IMPLANTAÇÃO DO PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO NO ÂMBITO DO PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO
DE SÃO PAULO
De muito sou defensor da
virtualização do processo judicial e da prática de atos processuais pelo meio
eletrônico. O processo eletrônico que sempre imaginei, como instrumento de
racionalização da Justiça e destinado a contribuir para que se opere a
efetividade da prestação jurisdicional, está muito distante de se assemelhar
com o que venho acompanhando nos últimos tempos, após a implantação desse
mecanismo no âmbito da Justiça Paulista, especialmente nas Varas Cíveis do
Fórum João Mendes e nas comarcas do interior.
Em que pese a iniciativa do
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, a forma pela qual vem se dando a
implantação, ao invés de se transformar em um benefício para que se opere a
celeridade na tramitação dos feitos, está se transformando em um sério e grave
problema, causando um sem número de transtornos, tanto para os serventuários da
Justiça, quanto para a advocacia e fundamentalmente aos jurisdicionados.
É certo que a implantação já se
mostrava mais que necessária, todavia, seria de fundamental importância que
fossem estabelecidos mecanismos, para que se desse de forma paulatina e progressiva,
para que todos os operadores do Direito pudessem e tivessem condições de se
familiarizar com esse novo ambiente, destinado a substituição do meio papel
para o meio eletrônico.
No meu sentir faltou sensibilidade
da presidência do Tribunal de Justiça Bandeirante, pois, no âmbito do estado de
São Paulo, são mais de trezentos mil advogados inscritos na nossa Seccional,
número esse, que jamais poderia ser ignorado pelas autoridades do Judiciário
Paulista.
A Seccional Paulista da Ordem dos
Advogados do Brasil, na pessoa do seu presidente Dr. Marcos da Costa, profundo
conhecedor do tema e também de muito defensor da virtualização do processo
judicial, sensível a magnitude do problema, em conjunto com as entidades da
advocacia do nosso estado (Instituto dos Advogados de São Paulo e Associação
dos Advogados do São Paulo), conseguiu no ano passado suspender a implantação
do processo eletrônico, de sorte que o Tribunal de Justiça do Estado de São
Paulo transferisse a obrigatoriedade de distribuição dos feitos e o
peticionamento pelo meio virtual, para o início do mês de fevereiro deste ano.
Em janeiro do corrente,
estabeleceu dez diretrizes a serem desempenhadas sob a forma de força tarefa,
para que os mais de trezentos mil advogados do nosso estado, pudessem se
adaptar a essa nova realidade. Tais premissas vão desde a redução no custo para
a aquisição da certificação digital até a realização de palestras, cursos,
seminários e congressos em todas as subseções da capital e do interior, para
ensinar o passo a passo do processo eletrônico, de sorte que todos os advogados
e advogadas do estado de São Paulo possam se capacitar, aprendendo, tirando
dúvidas, trocando experiências e constatando possíveis dificuldades que serão
levadas ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, para correção das
distorções, que, diga-se de passagem, não são poucas.
Particularmente, já participei de
alguns desses encontros em dezembro de 2012 e nos meses de janeiro e março
desse ano, ministrados pelo conselheiro estadual e presidente da Comissão de Ciência e Tecnologia da OAB-SP,
Dr.
Vitor Hugo de Freitas, e pelo também conselheiro estadual e presidente
da Comissão de Direito Eletrônico e
Crimes de Alta Tecnologia da OAB-SP, Dr. Coriolano A. Almeida Camargo. Em
todas as ocasiões os auditórios se apresentaram com sua capacidade de lotação
esgotada, sendo certo que entre os participantes, identifiquei as mais diversas
faixas etárias, mas também, uma predominância de advogados e advogadas de idade
mais avançada, muitos com mais de setenta anos, aqueles que no passado se
utilizavam de máquinas de escrever, e, que no meu sentir, são os que mais estão
preocupados com os impactos dessa inovação, visto que, essa transição, em
termos práticos, já está acontecendo com várias dificuldades não só no estado
de São Paulo, mas em todo o Brasil.
O que mais chama a atenção é o
fato de que não são poucas as dúvidas apresentadas neste momento de transição.
Mas existem também, situações que reputo mais complexas e que podem trazer uma
série de problemas para a advocacia e para os jurisdicionados.
Tanto é fato que no
ultimo dia 28 de fevereiro, reuniram-se na sede do Conselho Federal da Ordem
dos Advogados do Brasil, os presidentes das Comissões de Tecnologia da
Informação de todas as Seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB),
oportunidade em que debateram e apontaram os cinco principais problemas
detectados pela advocacia brasileira na utilização do Processo Judicial
Eletrônico (PJe).
Com sustentáculo nas experiências relatadas, foram
indicados os cinco maiores entraves para a implantação do processo eletrônico,
quais sejam: (a) a infraestrutura
deficiente de Internet; (b) dificuldades
de acessibilidade; (c) problemas nos
sistemas de processo eletrônico; (d) necessidade
de melhorias na utilização do sistema; e (e) a falta de unificação dos sistemas de processo eletrônico.
O lamentável diagnóstico identificado nessa reunião
será remetido para o Pleno da OAB, que debaterá o tema e encaminhará as
reivindicações da advocacia ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Ministério
da Justiça e ao Tribunal Superior do Trabalho. O escopo do envio das
reivindicações reside na necessidade de alertar e pugnar pela suspensão das
novas implantações até que possam ser definitivamente sanados os problemas de
ordem estrutural, de sorte a garantir que os advogados e advogadas do nosso
país, possam utilizar-se concomitantemente dos dois sistemas, ou seja, o
peticionamento “on line” e o peticionamento físico, evitando-se assim prejuízos
que acabariam por atingir não só a advocacia, mas fundamentalmente o
jurisdicionado e a sociedade.
O principal problema apontado, pasmem, encontra
sustentáculo na deficiente infraestrutura de Internet, especialmente em relação às
dificuldades de conexão e quedas no fornecimento dos serviços de energia
elétrica.
Vou mais além, pois existem localidades que se quer
possuem sinais para conexão de telefone e/ou Internet, outras com sistema de
Internet discada e/ou rádio, o que por obvio impede que os advogados e
advogadas possam se utilizar com tranquilidade do sistema do processo
eletrônico, quer seja para distribuição de novos feitos, quer seja para o
peticionamento eletrônico. Isto é muito grave!
Os problemas ligados à acessibilidade, também não
poucos, tanto que dentre as reinvindicações, reside a necessidade de fixação de
um período de transição para a migração total do meio físico para o meio eletrônico,
e, que os tribunais, em respeito a Lei do Processo Eletrônico, disponham de
estrutura para a “digitalização” dos processos. Da mesma forma que foram
detectadas urgentes necessidades de correção das instabilidades do sistema,
ampliação na limitação do tamanho para o envio de arquivos, dentre outros.
Mas o que me parece mais grave em tudo isto, e, de
muito já havia me manifestado a respeito, é, a ausência de unificação nos
sistemas de processo eletrônico. De forma absolutamente incoerente, no
meu sentir, cada tribunal, excetuada a Justiça do Trabalho, viu por bem,
desenvolver os sistemas atinentes ao processo eletrônico, estabelecendo
inclusive, regramentos próprios, o que se mostra no mínimo absurdo!
Preteritamente, já tive oportunidade de discorrer
sobre o tema, manifestando-me sobre o quanto seria importante a padronização
e/ou unificação dos sistemas pelos quais os feitos caminhariam eletronicamente.
A grande referência em minha opinião, era a
possibilidade de utilização do sistema criado pelo Superior Tribunal de Justiça
(STJ), pioneiro na “virtualização do processo judicial”, desenvolveu um software
específico e se dispôs a fornecer gratuitamente para todos os Tribunais do
Brasil, franqueando-lhes inclusive, a instalação, o treinamento aos servidores
e o suporte necessário para que todos pudessem operacionalizar o sistema.
Todavia, não logrou êxito na iniciativa, e, cada Corte de Justiça, seguindo as
suas próprias convicções, foi criando os sistemas de acordo com as suas
conveniências.
É lamentável, pois, muito mais simples seria,
valer-se de um sistema referência como o que foi criado pelo Superior Tribunal
de Justiça (e utilizado inclusive por órgãos do judiciário de outros países),
modificando-se apenas naqueles pontos que demandassem as peculiaridades de cada
órgão da Justiça.
Enfim, quer me parecer que “cada um resolveu correr com as
suas próprias pernas”, imprimindo velocidades das mais diferentes, e,
muitas delas, s.m.j, no afogadilho,
como se decorrentes de interesses políticos e midiáticos, sem se preocupar com
os reflexos que seriam causados não só para a advocacia, mas fundamentalmente
para a sociedade brasileira.
Sinceramente, espero que essas distorções sejam
urgentemente solucionadas, pois essa não é a forma de processo judicial
eletrônico, que sonhei quando comecei a discorrer sobre o tema, lá pelos idos
da segunda metade da década de noventa!
Gilberto
Marques Bruno