quarta-feira, 22 de julho de 2020

CONTEUDOS PUBLICADOS EM REDES SOCIAIS PODEM COMPROVAR AMIZADE ÍNTIMA E TORNAR SUSPEITO O DEPOIMENTO DE TESTEMUNHA EM PROCESSO JUDICIAL?






MENSAGENS E FOTOGRAFIAS PUBLICADAS OU TROCADAS EM REDES SOCIAIS PODEM SER ADOTADAS PARA COMPROVAR AMIZADE INTIMA E COMPROMETER DEPOIMENTOS JUDICIAIS:



Todos nós sabemos que o crescimento das redes e mídias sociais, revelam-se constantes no dia a dia das pessoas, cada vez mais, a troca de conteúdos entre as pessoas, torna-se corriqueira, tanto que o telefone, que era uma importante ferramenta de comunicação, em tempos outros, caminha para o absoluto esquecimento.

O impacto do uso da tecnologia é sentido por todos e em todos os momentos da vida em sociedade, esses tempos de pandemia, por exemplo, nos revelaram que vivemos um caminho sem volta, basta que tomemos como exemplo a realização de vídeo reuniões, vídeo encontros entre familiares e amigos, vídeo audiências e etc., o futuro se faz presente e aquilo que era considerado como ficção científica nos desenhos animados denominado Os Jetsons, série que foi produzida por Hanna-Barbera e exibida originalmente entre os anos de 1962 e 1963, cada vez mais, torna-se realidade. Assim são as redes e as mídias sociais.

Recentemente fiz publicar breves considerações a respeito do crescimento da força probatória dos conteúdos disponibilizados nas redes sociais, especialmente no que concerne a comprovação de amizade intima entre partes e testemunhas em processos trabalhistas, com publicações de fotografias em diferentes situações que revelam relacionamento estreito entre elas.

Na ocasião, discorrendo a respeito do instituto processual da contradita, que tem por objetivo desconstituir depoimentos de testemunhas dentro de uma das hipóteses previstas em Lei, de sorte que ocorra a reversão do caráter probatório, transformando-os em depoimentos meramente informativos, e, como tais, que não tenham a capacidade de influenciar na convicção, na formação do juízo de valor e nas razões de decidir dos magistrados.

Para tanto adotei como paradigma, decisão proferida pela Juíza Federal da 1ª. Vara do Trabalho de Pedro Leopoldo (Minas Gerais), “que acolheu a contradita de testemunha do reclamante em decorrência de fotografia divulgada na rede social Instagram.” A decisão será objeto de reexame em sede de recurso pelo Tribunal Regional do Trabalho, entretanto que se revelou de grande relevância.(https://gilbertomarquesbruno.blogspot.com/2020/05/as-redes-sociais-cada-vez-mais-ganham.html).

Na medida em que o uso das ferramentas de comunicação estão se ampliando, os desdobramentos decorrentes deste costume que se incorpora a vida das pessoas, de certa forma estão gerando questionamentos com maior frequência no âmbito do Poder Judiciário, e, consequentemente, começam a trazer precedentes de grande relevância nos “conflitos de interesse qualificados por uma pretensão resistida”, como dizia o jurista italiano Francesco Carnelutti.

E no esteio desses precedentes que começam a se consolidar, que a Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª. Região (GO), reformou sentença proferida pelo Juízo Federal da Vara do Trabalho de Catalão (GO), para acolher a contradita de uma testemunha de sorte que o depoimento, passasse a ser apreciado apenas e tão somente, na condição de informante do juízo, todavia, concluiu a Turma que no caso, não se tratava de hipótese destinada a declarar a nulidade do decisum.

A desconstituição da força probatória do depoimento da testemunha, foi amparado na ocorrência da hipótese de existência de amizade intima, que teria sido comprovada por meio de fotos e mensagens, que revelaram um grau mais elevado de afinidade nas redes sociais entre a reclamante e a testemunha por ela arrolada, aspectos que seriam capazes de excluir a legitimidade de um depoimento.

Em sede de defesa a ex-empregadora da reclamante, apresentou conteúdo de postagens nas redes sociais trocadas entre a parte autora e a testemunha por ela arrolada, postulando o reconhecimento da suspeição da testemunha, amparando seu pleito na existência de amizade intima.
Em suas razões de decidir, o juízo de primeiro grau, mencionou que as informações prestadas pela testemunha da parte autora, careciam de confiabilidade devido a amizade existente entre elas, mas que ainda assim, reforçariam as demais provas apresentadas nos autos, julgando o feito parcialmente procedente. Objetivando a declaração de nulidade parcial da sentença, interposto o recurso ordinário, a reclamada sustentou que o depoimento da testemunha deveria ser desconsiderado em decorrência da amizade intima.

O desembargador Eugênio Cesário, relator do recurso ordinário, ao estabelecer o seu entendimento, considerou como informação o depoimento feito pela testemunha. Ao analisar o conjunto probatório, entendeu que a própria depoente e as provas nos autos comprovaram a amizade estreita entre a parte e a testemunha, observando com precisão que “amigos íntimos são as pessoas ligadas por afeição e confiança”, ponderando que “nem todo amigo é amigo íntimo”.

Em seu voto, o relator asseverou que o ato de adicionar pessoas em listas de amigos nas redes sociais não configura, por si só, amizade íntima. Ele destacou que “para demonstrar a amizade virtual entre a parte e a testemunha, é necessário provar a amizade íntima, ainda que esta seja obtida mediante conversas e fotos extraídas destes meios de comunicação”.

Em suas ponderações o desembargador relator, discorreu no sentido de que “é possível extrair a prova de amizade íntima entre pessoas, demonstrando-se a eventual troca de mensagens afetuosas através das redes sociais, que denotem um grau mais elevado de afinidade”.

A pedra de toque para fortalecer o entendimento do relator, encontrou sustentáculo no fato de que, as fotos carreadas aos autos, que foram retiradas da página da rede social da autora, demonstraram que a testemunha com ela convivia fora do ambiente de trabalho, havendo inclusive declarações afetuosas feitas pela autora para o filho da testemunha.

Bem observou o relator que: ...“Aliás, a própria testemunha confessou tal fato, ao dizer em audiência que ‘à época em que trabalharam juntas, considerava a reclamante uma amiga, porque tinham proximidade por irem e retornarem juntas do trabalho ”... 

Destacando que uma amizade não deixa de existir somente pelo fato de os amigos não trabalharem mais no mesmo ambiente, na medida em que o afastamento pode reduzir o contato entre eles, sendo que apenas outra circunstância mais grave é capaz de abalar os laços de amizade firmados.

Penso que o relator do recurso ordinário, caminhou com muita propriedade ao externar posicionamento no sentido de que a amizade intima pode ser sim, demonstrada por meio de registros fotográficos, por meio de mensagens trocadas entre as partes, notadamente quando tais mensagens, a luz dos seus conteúdos, revelem grau de proximidade, de afetividade, de intimidade. Na mesma toada, entendo que fotografias e até mesmo outros tipos de conteúdos veiculados nas redes e/ou mídias sociais, tais como áudios, vídeos e outros, podem comprovar estreiteza de relacionamento entre as pessoas.

Reputo, pois, tratar-se de mais uma decisão importante que auxilia na formação de precedentes para comprovação de relacionamento de amizade entre as partes e eventuais testemunhas arroladas, por conta de publicações, imagens, vídeos e outros conteúdos disponibilizados em redes sociais, já que na atualidade essas ferramentas de comunicação, cada vez mais, estão a se incorporar na vida das pessoas.
  
GILBERTO MARQUES BRUNO 
Advogado é sócio fundador de MARQUES BRUNO Advogados Associados (OAB/SP n.: 6.707) – É Tributarista e especialista em Direito Empresarial, Direito Público e Direito Eletrônico – É Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito das Faculdades Metropolitanas Unidas – FMU (Turma de 1988) - É pós-graduado em Direito Empresarial (lato senso) e Direito Tributário (estrito senso) pelo Centro de Estudos e Extensão Universitária das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) 1.ª Turma (1992) - É conselheiro da Associação Comercial de São Paulo - ACSP (2019/2021) – É conselheiro da Associação dos Advogados Trabalhistas de São Paulo – AATSP (2019/2020)