sexta-feira, 27 de maio de 2011

O FORTALECIMENTO DA PENHORA ON LINE APÓS A EDIÇÃO DA LEI N.: 11.382/2006 SOB A ÓTICA DOS TRIBUNAIS

A PERMISSIVIDADE DA CONSTRIÇÃO JUDICIAL EM TEMPO REAL SOB A ÓTICA DA QUARTA TURMA DO TRIBUNAL DA CIDADANIA

De muito tenho questionado a validade dos atos que determinam a contrição judicial em tempo real, notadamente pelo fato de que, embora a legislação processual civil estabeleça na ordem de preferência para a penhora o dinheiro, ainda assim, entendo que o bloqueio pelo Sistema BACEN-JUD, tem o caráter impactante de desapossar o titular dos seus ativos financeiros custodiados junto às instituições financeiras.

O impacto e forma abrupta da medida, em determinadas circunstâncias, pode se tornar desastroso, notadamente, se tivermos em mente, pessoas jurídicas de direito privado, em especial aquelas que guardam o porte pequeno e que a cada novo dia, lutam com muita dificuldade para enfrentar as adversidades postas em seu caminho para o desenvolvimento das atividades empresariais em nosso país.

Porém com o crescimento da informatização e o afã de uma Justiça mais célere, hoje, vinculada ao cumprimento de metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça, o Poder Judiciário vem adotando com grande freqüência a utilização do sistema BACEN-JUD.

Em tempos pretéritos, tinha-se inicialmente como maior usuária do programa a Justiça do Trabalho, uma das primeiras a se informatizar no Brasil, com o passar do tempo e a implementação de tecnologias da informação em outros órgãos do Poder Judiciário, a utilização do sistema BACEN-JUD, estendeu-se para a Justiça Federal e para a Justiça Estadual, cujos números de consultas e até mesmo de bloqueios de ativos financeiros, tem se ampliado de forma extremamente elevada.

Por via de conseqüência, as teses jurídicas e as discussões sobre o tema, a sua legalidade, o limite e o alcance de possíveis atos de constrição, começaram também a ser alvo de apreciação pelos Tribunais, tudo sempre em prol da preservação do Princípio do Contraditório e da Ampla que se encontra consubstanciado na Vintenária Carta de Regência.

Na atualidade, os entendimentos esposados pelos Tribunais Superiores, começam a se consolidar, e, ao que parece, por tendência natural, a constrição judicial em tempo real, já está se tornando algo corriqueiro nas lides suscetíveis de execução, inclusive em se tratando de matéria de natureza tributária.

A respeito do tema remeto o leitor ao estudo de nossa lavra denominado “Breves Considerações sobre a virtualização da Constrição Judicial e os Avanços Tormentosos para a Classe Empresarial após a parceria firmada entre o Banco Central e o Poder Judiciário”, elaborado no ano de 2005 e disponibilizado no seguinte endereço:http://www.escritorioonline.com/webnews/noticia.php?id_noticia=5886&

Observo ainda, que existem aspectos positivos que podem ser levantados, na medida em que, consolidando-se o tema e definindo-se linhas mestras para efetivação do “modus operandi”, o sistema poderá ser justo e não causará danos irreparáveis e/ou de difícil reparação, podem que nascer do impacto de uma pessoa física e/ou jurídica, ver e ter de uma hora para outra, o seu patrimônio financeiro ou parte dele, indisponível e transferido para garantir eventual débito que se encontre em litígio, mas pelo que noto, ainda existem distorções que deveriam ao menos, ser observadas, senão pelo Poder Judiciário, fundamentalmente pelos nossos legisladores, como por exemplo o bloqueio de ativos financeiros decorrentes de proventos de aposentadoria para pessoas físicas, de faturamentos para pessoas jurídicas, dentre outros. Contudo, o avançar da jurisprudência, está começando a clarear o tão polêmico tema.

Recente entendimento firmado pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça em sede de julgamento de Recurso Especial assevera a permissividade da constrição judicial em tempo real após o mês de dezembro de 2006, sem a necessidade de dilação probatória no sentido de que se deu o esgotamento das vias extrajudiciais.

O que vale dizer é possível que se dê a penhora de valores disponíveis em conta bancária de devedores por meio do sistema BACEN-JUD, sem que o credor faça prova de que esgotou todos os caminhos extrajudiciais na busca de bens suscetíveis de constrição, após a vigência da Lei Federal n.: 11.382/2006.

O Recurso Especial objeto de julgamento, acolheu pleito formulado pelo Banco BRADESCO S/A, que havia aforado uma ação de execução contra devedor solvente por título executivo extrajudicial contra uma microempresa, pela importância de R$ 11.788,71 (onze mil, setecentos e oitenta e oito reais e setenta e um centavos), relativa a uma cédula de crédito bancário.

Na origem, o pedido fora negado, sob a fundamentação de que a cártula levada à execução referia-se a um contrato de limite de crédito, e, que a instituição financeira exeqüente, deveria provar a forma de utilização do dinheiro que havia sido colocado à disposição do seu correntista, enfatizando-se a ausência de certeza quanto ao valor liquido que teria sido utilizado.

Irresignada, a instituição financeira interpôs apelo, cujo seguimento fora objeto de negativa por decisão monocrática do Desembargador relator. Interposto Agravo Regimental, o Tribunal de Justiça do Mato Grosso, negou provimento ao recurso. Foram opostos Embargos de Declaração, que igualmente, foram objeto de rejeição e o Recurso Especial, fora barrado pelo Pretório Estadual, quanto à sua admissibilidade.

Com a interposição de Agravo de Instrumento junto ao Tribunal da Cidadania, a peça recursal foi objeto de conhecimento, de sorte a conferir provimento ao recurso na via especial, de sorte a determinar ao Tribunal de Justiça do Mato Grosso, que novamente apreciação os embargos declaratórios, retornando o feito à corte estadual. No mérito os embargos de declaração foram acolhidos para reconhecer a cédula de crédito bancário como título executivo hábil para conferir embasamento a ação executiva, determinando-se por via de conseqüência, o prosseguimento da ação.

Com isto, fora objeto de expedição o competente mandado de citação, penhora/arresto e avaliação, que não se perfectibilizou porque o meirinho, após efetuar as diligências necessárias, constatou que o único bem encontrado em nome dos executados, seria um imóvel, que, por estar locado, já era objeto de embargos opostos em outros feitos.

Nesse exato momento, a exeqüente, diante da impossibilidade de se efetivar a penhora, pugnou pela constrição em tempo real dos ativos financeiros porventura existentes em nome dos executados. O Pretório Estadual indeferiu o pedido em março de 2008.

Junto ao Superior Tribunal de Justiça, a instituição financeira, sustentou que o Tribunal do Estado do Mato Grosso, não teria levado em consideração as modificações havidas no estatuto processual civil com o advento da Lei Federal n.: 11.382/2006, que determina, nos casos de ações de execução, que a constrição deve recair preferencialmente em dinheiro, espécie ou depósito ou aplicações financeiras. Ainda em sua tese, argumentou que estaria equivocada a exigência de esgotamento dos meios para a localização de outros bens suscetíveis de penhora.

Ao exarar o seu voto, o ministro Luis Felipe Salomão, destacou que para a verificação da possibilidade de realização de penhora online, o STJ estabeleceu dois entendimentos, segundo a data em que foi requerida a penhora, se antes ou após as alterações introduzidas pela Lei n. 11.382/06.

Disse ainda o ilustre ministro, que o primeiro posicionamento, aplicável aos pedidos formulados antes da vigência da lei, é no sentido de que a penhora pelo sistema BACEN-JUD constitui-se em medida excepcional, cabível apenas quando o exeqüente comprova que exauriu todas as diligências no sentido de localizar bens livres e desembaraçados de titularidade do devedor.

Já o segundo por seu turno, segundo o ministro, seria aplicável aos requerimentos efetuados após a entrada em vigor do referido texto legislativo, no sentido de que essa modalidade de penhora não exige mais a comprovação de esgotamento de vias extrajudiciais de busca de bens a serem penhorados.

Posicionando-se o relator no sentido de que: ...“A orientação atual do STJ é no sentido de admitir a penhora sobre o dinheiro, em espécie ou em depósito ou aplicação em instituição financeira, por possuir preferência na ordem legal de gradação”...

Repito o tema que sempre foi objeto de polêmica, e, que já tive oportunidade de levantar em várias discussões na medida em que o bloqueio de ativos financeiros passou a ser adotado de forma constante pelos magistrados em nosso país, ao que parece, começa a ser pacificado, ao menos no tocante a definição de uma possível data de corte para sua imediata aplicabilidade ou não.

Se de um lado isso é positivo, ao menos para os credores, e em especial para as instituições financeiras, de outro, para os devedores, notadamente, os que acabam diante das dificuldades em suas atividades, tornando-se reféns dentre outros, de juros elevados junto aos bancos, esse entendimento, poderá transformar-se em um verdadeiro martírio, na medida em que, em tais situações, as suas chances de defesa junto ao Poder Judiciário, tendem as se esvair.

Ao que noto, a tendência é que esse posicionamento, com o breve passar do tempo, acabará se consolidando e a prevalência da constrição judicial em tempo real, que diga-se de passagem, já algo costumeiro na busca de créditos suscetíveis de penhora, tornar-se-á matéria pacificada em nossos Tribunais Superiores.

Gilberto Marques Bruno

domingo, 22 de maio de 2011

A VIRTUALIZAÇÃO DO PROCESSO JUDICIAL EM PORTUGAL

OS AVANÇOS NA IMPLEMENTAÇÃO DO PROCESSO VIRTUAL EM PORTUGAL

A virtualização do processo judicial, não é uma realidade que alcança só o Poder Judiciário brasileiro.

É certo que quando se trata deste tema, o Brasil é pioneiro, notadamente se levarmos em conta o sistema adotado pelo Superior Tribunal de Justiça, que já tive oportunidade de registrar em outros trabalhos, tem se transformado em uma referência mundial, disponibilizando inclusive tecnologia e treinamento para os órgãos do Poder Judiciário de outras nações.

O fato incontestável, em que pesem eventuais resistências, é que as ferramentas tecnológicas estão sendo adotadas pelos órgãos da administração pública, não só no Brasil, mas em vários países mundo a fora.

Quem está avançando no sentido de abolir definitivamente o papel é o Poder Judiciário português. A nação lusitana, nossa co-irmã, é uma demonstração disto.

No final do ano de 2009, cerca de 90% (noventa por cento) das ações que chegaram ao Poder Judiciário em Portugal, foram aforadas pelo meio eletrônico.

Diferentemente do Brasil, a informatização da Justiça e a adoção de ferramentas tecnológicas que ensejaram o processo virtual, começaram de baixo para cima. Para que se tenha uma exata noção do quão se fez importante esse tipo de postura, registro que atualmente, todos os pouco mais de 1,3 mil magistrados lusitanos, que atuam na primeira instância, se encontram habilitados para lidar e julgar o processo pelo eletrônico, ou seja, sem o meio físico papel.

Esses números animadores foram objeto de divulgação pelo Ministério da Justiça, em 26 de novembro de 2010, durante a realização do VII Encontro do Conselho Superior da Magistratura, que se deu na cidade de Évora.

De acordo com o vice-presidente do Conselho Superior da Magistratura, José Manuel de Sepúlveda Bravo Serra, estima-se que em 10 (dez) anos, todo e qualquer processo no Judiciário português, começará e terminará apenas pelo meio eletrônico.

Em uma primeira imagem, é certo que se comparado ao Brasil, o Judiciário de lá, encontra-se muitos passos à frente. Todavia, é necessário que possíveis comparações se façam de forma muito cautelosa, sob pena de se tornar extremamente injusta.

Todos nós conhecemos como funciona o sistema judiciário brasileiro, todas as dificuldades existentes, dentre elas, falta de pessoal, materiais, equipamentos, recursos orçamentários, e, a necessidade de administração de milhões de processos em tramitação pelos Tribunais do país.

Portugal, porta de entrada para a Europa, tem no seu Poder Judiciário, algumas centenas de milhares de processos, essa certamente é a grande diferença que lhes permite um avanço maior na implantação e utilização de ferramentas tecnológicas destinadas a conferir maior celeridade na tramitação de feitos pelo ambiente virtual.

Os números demonstram inclusive, o porquê da viabilidade em se iniciar a implantação de um sistema através da primeira instância. Em Portugal, o primeiro grau, é composto por cerca de 1,3 mil juízes, e, sua totalidade não suplanta algo em torno de 2 mil magistrados. Nós no Brasil temos números bem mais elevados. Apenas a titulo de ilustração, só no estado bandeirante, a primeira instância do Poder Judiciário possui quase 2 mil Juízes de Direito. Sendo, pois, essa a grande diferença.

O programa de informatização do sistema judicial em Portugal, é denominado “desmaterialização processual”, e, fica sob a responsabilidade do Instituto das Tecnologias de Informação na Justiça (ITIJ), órgão ligado ao Ministério da Justiça, que é o responsável pelo projeto “justiça sem papel”.

Denominado “citius”, o sistema que permite que as ações sejam aforadas por meio eletrônico, foi criado em 05 de janeiro de 2009, data em que se comemora o nascimento do “processo eletrônico” em Portugal.

Por esse sistema, se encontram habilitados para lidar com os processos sob a forma “virtual”, os advogados, juízes e promotores, que por enquanto, atuam apenas em grande parte dos casos cíveis, e, segundo o Ministério da Justiça, cerca de 75% dos atos processuais em primeira instância já são realizados pelo meio eletrônico.

Diferentemente do nosso país, onde a virtualização teve inicio de cima para baixo, o desafio maior do governo português, está na implementação da informatização nas instâncias superiores. Pode parecer um paradoxo, pois, embora os tribunais de segundo grau tenham um número menor de processos em tramitação, de acordo com os próprios magistrados, o problema reside no fato de que a tecnologia precisa atingir a casa dos juízes, pois, sua grande maioria, prefere labutar no conforto de suas residências, o que implicaria a necessidade do sistema interno do tribunal, transpor barreiras físicas e percorrer distâncias, sem que para tal, comprometa a eficiência e a segurança.

Embora o uso de ferramentas tecnológicas, possa trazer uma série de benefícios ao Poder Judiciário de Portugal, ainda assim, não são poucas as críticas. Os magistrados reclamam que o processo tramitando sob a forma virtual, teria trazido mais lentidão à Justiça.

Pode até ser uma situação contraditória para todos nós que somos árduos defensores deste tipo de procedimento, mas não deixa de ser algo verdadeiro.

Todavia, no meu sentir, é uma situação temporária e até mesmo transitória, que demanda a necessidade de adaptação, e, conseqüentemente, de mudança de cultura, inclusive do próprio magistrado lusitano, que certamente, na medida em que passar a manusear os equipamentos com maior facilidade, verificará que a acessibilidade é muito mais célere e melhor do que ficar compulsando pilhas e pilhas de papéis que se encontram em cima da sua mesa.

Também há muita desconfiança por parte dos magistrados, quanto as questões de segurança da informação, no sentido de que seja impedido o acesso de informações sigilosas, confidenciais, que ainda sejam passiveis de preservação. Sendo que nesse encontro realizado em Évora, essa foi uma das grandes preocupações e reivindicações postas em discussão. Também se colocou em pauta de discussão, a necessidade de modificação e/ou adaptação da legislação processual, que, segundo os magistrados, ainda se apresenta como um grande obstáculo para que o sistema funcione sem maiores problemas.

Penso que são aspectos facilmente solucionados, na medida em que, o vice-presidente do Conselho Superior da Magistratura em Portugal, estima um prazo de 10 (dez) anos para definitivamente não mais existam processos tramitando no Judiciário lusitano em papel.

No meu ponto de vista, é tempo mais que suficiente, pois, questões de segurança da informação e eventuais mudanças na legislação, não seriam obstáculos intransponíveis para o total e completo funcionamento do sistema.

Enfim, de uma forma ou de outra, as preocupações e dificuldades, certamente serão superadas facilmente, pois, se já existe um sistema em funcionamento, os ajustes poderão ocorrer paulatinamente e quando menos perceberem, nossos irmãos lusitanos estarão se utilizando do Poder Judiciário, apenas e tão somente pelo meio eletrônico.

Gilberto Marques Bruno