Foi em um dia 05 de outubro, na voz do então presidente do Congresso
Nacional Constituinte, o saudoso deputado Ulysses Guimarães, que foi promulgada
a nova Carta Constitucional brasileira.
Um dia histórico para a nação, quando a “Constituição Cidadã”, sepultou definitivamente a
Constituição Brasileira de 1967 (que foi votada em 24 de janeiro de 1967 e
entrou em vigor no dia 15 de março de 1967), e, que legalizou e
institucionalizou o regime militar no país como consequente do “Golpe de
Estado” de 1964, permitindo a vigência do regime de exceção por mais de 24
(vinte e quatro) anos!
Naquele momento foram restabelecidos os Direitos e as Garantias
Individuais!
Direitos esses, apenas a guisa de ilustração, que foram ceifados pelos Atos Institucionais, onde o mais grave, sem
sombra de dúvidas, foi o Ato Institucional n.: 5 de 13 de Dezembro de 1968 (que
fora redigido pelo ministro da justiça Luís Antônio da Gama e Silva em 13 de
dezembro de 1968, entrou em vigor durante o governo do então presidente Artur
da Costa e Silva, sobrepondo-se à Constituição de 24 de janeiro de 1967, bem
como às constituições estaduais), que conferia poderes extraordinários ao Presidente da
República e suspendia várias garantias constitucionais, e, também pela Lei de
Segurança Nacional (Decreto-Lei n.: 314 de 15 de março de 1967).
Renascia naquele 05 de outubro, não só, definitivamente, o resgate do
Estado de Direito e a prevalência das Instituições Democráticas, mas acima de
tudo, a esperança de toda uma nação, e, em especial de muitos que como nós,
nasceram e cresceram durante uma época em que, o grande lema dos então
presidentes da República, restringia-se a seguinte expressão: ...”Brasil AME-O OU DEIXEI-O”...
Uma época em que, de forma intencional, quando determinadas decisões
deveriam ser adotadas pelos governantes, a opinião pública era premiada com
transmissões de jogos de futebol, desviando-se os olhares daquilo que
efetivamente era importante para o país e para o povo!
Um período “nebuloso” em que, sob a vigência da malsinada Lei Falcão, as propagandas
eleitorais se resumiam em disputas de dois partidos políticos, a Arena e o MDB,
e, os pleitos eleitorais ocorriam de forma indireta. O poder não era emanado pelo povo, mas em seu nome era exercido!
Enquanto isto a “Junta Militar” governava; as Forças Armadas tomavam conta das ruas reprimindo qualquer
espécie de manifestação popular; brasileiros eram investigados, presos e
torturados nos “porões” do DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informações - Centro de
Operações de Defesa Interna, que foi um órgão subordinado ao Exército, de inteligência e repressão durante o regime inaugurado com o golpe
militar de 31 de março de 1964); os
agentes do “regime” encontravam-se infiltrados em todos os lugares e em especial nas
Faculdades de Direito.
Sempre ouvimos de nosso pai, que entre os seus colegas de turma, havia
agentes do DEOPS (Departamento de Ordem Política e Social), que em companhia
dos estudantes, se misturavam nos corredores das universidades, cursando a
faculdade e observando o comportamento daqueles que eventualmente poderiam se
apresentar como opositores do regime.
Permaneciam ceifadas as garantias e liberdades
individuais e coletivas; remanesciam
inexistentes o direito de livre manifestação, de liberdade de expressão, de
reunião, do contraditório e da ampla defesa, e tantos outros; e, lamentavelmente, muitos, mais muitos brasileiros, acabaram
desaparecendo, vitimados pelos atos repressivos praticados nos “anos de chumbo”!
Na sua grande maioria, cidadãos honestos, trabalhadores, estudantes,
pais de família, intelectuais, artistas, lideres estudantis e tantos outros,
que se opuseram ao regime, e, que de forma discricionária eram considerados
subversivos ou comunistas!
No caso do exercício da Advocacia, não era diferente! Advogados e
Advogadas, como é o caso da nossa queridíssima amiga Zulaiê Cobra Ribeiro, os ex-presidentes da Seccional Paulista da Ordem
dos Advogados do Brasil, Cid Vieira, Mario Sérgio Duarte Garcia e tantos outros
que anonimamente, eram aviltados em
seus direitos e prerrogativas, no enfrentamento das ilegalidades das prisões
dos seus constituintes, mas, que bravamente resistiram, não se calaram e
permaneceram combativos, sem comungar com as atrocidades cometidas pelos
agentes da repressão!
Da mesma forma que, um jovem magistrado, que exercera a Advocacia antes
de ingressar na carreira, o estimado amigo e que fora nosso professor de
Direito Constitucional, à época com 33 (trinta e três) anos de idade, Juiz Federal da 7ª. Vara Cível
da Seção Judiciária de São Paulo, com apenas 02 (dois) anos de magistratura, Marcio José de Moraes (hoje Desembargador
Federal e ex-presidente do Tribunal Regional Federal da Terceira Região – SP no
ano 2001), corajosamente e sob o
risco de ameaças em relação a sua vida e de sua família, e, até mesmo de ser
cassado e banido da magistratura, não se curvou ao regime de exceção e proferiu
em 25 de outubro de 1978 (em plena vigência do Ato Institucional n.: 05), a
histórica sentença de 56 (cinquenta e seis) páginas (datilografadas em uma máquina
Olivetti Lettera 22), nos autos da Ação Declaratória n.: 136/76 onde
responsabilizou e condenou a União Federal pela morte do jornalista Vladimir
Herzog, abalando os pilares de sustentação da ditadura!
Por essas e tantas outras razões, é que na nossa modesta opinião,
reputamos que a promulgação da Carta de Regência de 1988, foi o momento mais
marcante da história moderna do Brasil!
Recordo-me que transcorridos alguns dias da promulgação da Constituição
Federal de 1988, entre a segunda quinzena de outubro e o início de novembro
daquele ano, na condição de aluno do quinto ano de Direito das Faculdades
Metropolitanas Unidas (FMU-SP), no finalzinho do curso, participei de uma
solenidade de homenagem para alguns deputados constituintes, dentre eles, o saudoso
Professor Ulysses Guimarães e o então deputado Bernardo Cabral, naquela
oportunidade, com muita honra fora escolhido para representar o corpo de alunos
da instituição.
Todavia, como ainda nos encontrávamos sob os resquícios do regime de
exceção, a cerimônia que contou com a presença de autoridades do Legislativo,
do Executivo e do Judiciário em todos os níveis, deu-se no salão nobre da
faculdade, com as “portas fechadas” e segurança feita pelo Exercito Brasileiro, encontrando-se presente, o
então General de Exército e Ministro Walter Pires de Carvalho e Albuquerque,
representando o trigésimo primeiro Presidente da República do Brasil José
Sarney, que sucedeu ao General João Batista de Oliveira Figueiredo, sendo
empossado presidente após a morte de Tancredo Neves (presidente eleito
indiretamente pelo Congresso Nacional e não empossado).
São algumas lembranças que temos do nosso tempo de criança, de
adolescente, e, que já na juventude, concluindo a Faculdade de Direito, ainda
sem muito compreender sobre o assunto, acabamos por vivenciar a transição do
regime e acompanhar toda a movimentação da Assembleia Nacional Constituinte, o
que acabou por despertar a nossa paixão pelo Direito Constitucional!
Hoje a Lei Maior, está a completar o seu Jubileu de Prata, por
coincidência, estamos completando também neste ano, 25 (vinte e cinco) anos da
conclusão do Curso de Direito da Turma 325-F das Faculdades Metropolitanas
Unidas (FMU), e, consequentemente, de Advocacia, com a felicidade de exercer a
nossa profissão com plenitude e liberdade sob a égide do Estado Democrático de
Direito!
É certo que nessas duas décadas e meia, o país vem passado por uma série
de transformações sob todos os aspectos, e, que por muitas vezes, alguns
representantes do Legislativo e do Executivo, tentaram aviltar a Constituição
Federal, com manobras destinadas a fazer com que alguns dispositivos fossem
considerados letra morta, mais ainda assim, a mais que Vintenária Carta de
Regência esta a sobreviver!
Basta que tomemos como exemplo, as recentes manifestações da população
que lotaram as ruas em diversos Estados da Federação, com reivindicações por
melhores condições de transporte, saúde, educação, segurança e outros.
Excetuados os casos de vandalismo, tivemos uma prova inexorável do exercício da
cidadania e da prevalência do regime democrático no Estado de Direito! A exata
tradução do exercício ao direito da liberdade de expressão e da livre
manifestação!
Enfim, ainda que os mais céticos venham a se opor, pensamos que muito se
tem por comemorar nesse 25º. (vigésimo quinto aniversário) da Carta
Constitucional, a “Constituição Cidadã”, assim batizada pelo
saudoso Dr. Ulysses Guimarães!
Hoje, enquanto cidadãos, somos detentores de
liberdade para exercitar em sua plenitude cada um dos direitos e garantias,
sejam eles individuais ou coletivos, podemos nos expressar livremente, podemos
nos reunir em locais fechados e etc., enfim, nos é assegurado o direito de
viver democraticamente!
Enquanto Advogados, embora a Senhora Presidente da República Dilma
Rousseff (que foi vítima da ditadura militar e
teve oportunidade de se valer da intransigente defesa de advogado), tenha,
recentemente, dito de forma infeliz e equivocada durante seminário empresarial
em Nova York, que “advogado é custo”, na exata
inteligência do artigo 133 da Carta Constitucional, “somos detentores da indispensabilidade à administração da Justiça,
sendo-nos assegurada, a inviolabilidade por nossos atos e manifestações no
exercício profissional e nos limites estabelecidos pela Lei”, o que nos permite
defender de forma intransigente os interesses que nos são confiados, dentre
eles o direito à liberdade em sentido amplo, lutando diuturnamente pela
prevalência do Direito e da Justiça!
Ficam os nossos registros nesse dia em que, há exatos 25 (vinte e cinco)
anos, os representantes do povo brasileiro,
reunidos em Assembleia Nacional Constituinte, para instituir um Estado
Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e
individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a
igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna,
pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na
ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias,
promulgaram sob a proteção de Deus, a CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO
BRASIL!
E que celebremente o então presidente da Assembleia
Nacional Constituinte, Ulysses Guimarães disse: ...“Declaro
promulgado o documento da liberdade, da democracia e da justiça social do
Brasil”...
São Paulo, em 05 de outubro de 2013.
Gilberto Marques Bruno
Advogado
Sócio Fundador de Marques Bruno Advogados Associados
Especialista em Direito Empresarial, Direito Tributário, Direito Público e Direito sobre Internet e outras Tecnologias
Conselheiro do Conselho Direitos e Prerrogativas da Seccional Paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (Triênio: 2013/2015)
Prezado Doutor Gilberto.
ResponderExcluirCertamente não esperava outro texto a não ser o belíssimo grafado por Vossa Senhoria, texto esse que me permita a franqueza, não conhecia em diversos aspectos da História, principalmente da História Jurídica Nacional, posto que vivi na Ditadura Militar, dentro dos quartéis da Aeronáutica, dentro de uma vila militar, amparado e vigiado por militares, sem muitas chances de expressar o que sentíamos.
Aceite meus cumprimentos e fraternais abraços. Clóvis Cortez de Almeida
Estimado amigo Clovis, muito obrigado! Forte abraço!
ResponderExcluir